quinta-feira, 18 de abril de 2013

Jornalismo dos juros e inflação


Enviado por Nairo Alméri - quin, 18.4.2013 | às 15h04 

Pronto! O Globo, O Estado de S.Paulo, Valor Econômico, Folha de S.Paulo e Zero Hora, que são os principais jornais do país – critérios de tiragem e/ou credibilidade (e os dois juntos) -, foram atendidos pelo Comitê de Política Econômica (Copom), do Banco Central – do Ministério da Fazenda.  A taxa de juros básicos, a Selic, foi aumentada em 0,25 ponto percentual. Agora corrige ganhos e onera dívidas em 7,5% ao ano. O Governo concordou com todo o noticiário e comentários dos artigos e colunistas dos últimos 20 dias: a medida é uma “cautela” para “conter” a inflação que estourou “teto da meta”.

Nas manchetes, de hoje, nos cinco diários citados, as palavras-chaves se repetem. E são velhas conhecidas de ajustes passados pelo Copom, em 2011, 2009, 2007... Os textos seguem mesma linha histórica. O fascínio dos jornais brasileiros por “inflação”, “juros altos”, “estouro da meta” etc. é tal que, nas Redações, são festejados os releases das “avaliações” tipo múltipla escolha para o juro Selic (alta, baixa e manutenção), remetidas de véspera ou horas antes pelas assessorias de presidentes de federações e confederações e outras entidades empresariais. Absurdo! Desrespeito para com leitores (assinantes e avulsos) e anunciantes.

Nenhum dos jornais, entre O Globo, Estadão, Valor, Folha e Zero Hora, optou por avançar, nas manchetes (também iguais em número de linhas: duas), no day after à decisão do Copom. Como ficará a vida do país – do consumidor, da indústria, do comercio, da empresa de serviços etc. Aliás, essa deveria ser a discussão, 20 dias antes. Agir para tornar insignificante a reunião do Copom com diante de um fórum nacional pelo fim de mesmices administrativas e fisiológicas da administração pública (federal, estadual e municipal) e demais poderes: incompetência, custos elevados da máquina (criação de mais ministério, atendimento aos reajustes salariais de deputados, senadores e ministros dos tribunais, aposentadorias milionárias), nepotismos, desvios de verbas, corrupção, superfaturamentos etc. Não permitir a eternização do benefício dos culpados, que sempre apostam no esquecimento da opinião pública, e que o escândalo (e são tantos) de hoje sepultará o de ontem.

A elevação dos juros não era novidade. Portanto, não merecia manchete. Tratava-se de desejo unânime do noticiário (dos mesmos jornais e tantos outros), há, pelos menos, duas semanas. O Governo (Copom), portanto, optou por isso. Tinha clima favorável na mídia. Os jornais fizeram a cama para o ministro da Fazenda, Guido Mantega repousar sua inércia. Um segundo motivo para não merecer alto de página é que, desde a noite de ontem, a decisão tinha sido devorada nos telejornais, rádios, sites diversos, blogs, facebook, twitters. Também comentada em botecos, pontos de busões, plataformas dos metrôs, dentro dos táxis, ciclovias, salas de embarques de aeroportos etc. Até agiotas tinham, em mãos, novas tabelas para os seus juros.

A melhor prestação de serviço (a mais inteligente) teria sido criar clima amplo para a discussão de redução nos gastos públicos; pela qualidade nas aplicações das verbas públicas; por apurações rápidas e sérias no uso de orçamentos sem licitação da Presidência da República etc. Qualquer Chefe de Reportagem iniciante é servido, diariamente, por uma lista bíblica de temas relevantes. Não há dificuldade alguma em deixar de pautas releases pró-presidente, pró-governadores, pró-prefeitos etc.

Nenhum dos cinco jornais nominados tem sede em Brasília. Mas todos gostam (abusam) do noticiário chapa branca. É uma assessoria de imprensa gratuita para Governo, autarquias e empresas estatais. A União, diga-se, tem custo fixo de assessoria de imprensa que orçamentos de capitais.  Os jornais prestam, no geral, igual serviço ao Senado, Câmara de Deputados e Tribunais. Cumprir pautas pró-Governo virou ofício em Brasília. É um padrão e jornal algum parece desejar abandonar. No dia seguinte, então, tudo igual (como hoje, na manchete para o Copom). Resultado: que tiver menor fôlego de mídia perde mais assinantes, leitores avulsos, publicidades etc. E, no final da semana, acumula um rosário maior de consequências, como se não bastasse as perdas (sem esforço de caixa) que o mundo digital causa.

Às vezes, a torcida pela elevação de juros é tanta que o Copom frustra colunistas. Em rede de telejornal matinal, ontem (17/04/2013), foi dito mais ou menos o seguinte (por isso não vai com aspas): a expectativa do mercado é da elevação de meio ponto (0,50) percentual. Mantega e seus pares do BC, então, estão no débito, pois o(a) porta-voz pedira 100% a mais.

E é comum, jornalista que torcem pelo pior, mas que não desejam assumir isso. Aí, se valem de fontes inventadas, que ganham vida no recurso do off : “...uma fonte me disse...”, “conversei com uma fonte do mercado” etc. As expressão funcionam, também, como lobby em causa própria, para transparecer conhecimento. É outra praga que deveria ser banida das Redações. Nesse campo sobrevivem: ... “o mercado diz...”, “... a expectativa do mercado”, “... o mau humor do mercado...”, etc.

Passou da hora (milhares de horas) de os Diretores de Redação – em televisão, rádio, jornal e revista – darem um basta na falta de criatividade e do noticiário sem conteúdo day after ao fato. É também, com atraso, o momento para se aposentar mentiras do tipo “... o mercado interpreta...”.

Faltam 41 dias (28 e 29 de maio) para a abertura da próxima reunião do Copom. É tempo razoável para os comandantes dos jornais pensarem mais no país, e se precisam, mesmo, ‘manchetar’ a Selic, o ministro Mantega, a presidente Dilma, ... Certamente, e valerá bem mais tratar disso, o país seguirá o dia a dia nacional: caos nos portos, derrubadas na Amazônia, falta de água no sertão do Nordeste, violência urbana (criminalidade infantil, motoristas bêbados no trânsito – causando mortes e sendo inocentados do flagrante via fianças), podridão na saúde pública e ensino, ociosidade nos quartéis das Forças Armadas, sobrepreços em contratos (da Petrobras, União, Estados e Municípios), débitos dos clubes de futebol com INSS/FGTS (e brindados com estádios novinhos pagos com dinheiro de impostos – recurso que falta em hospitais, segurança, ensino, transporte etc.) entre outros. Os jornais poderiam transformar uma das espertezas do Planalto, que tanto noticiam, em assunto amplo: “agenda positiva”, mas para o país!

Para o bem do país, a imprensa mudar. Já!

Um comentário:

  1. Prezado Nairo,

    Enquanto economista eu discordo de muitas coisas (não esperava obviamente que você, como jornalista, fosse descrever economicamente o que representa elevar apenas 0,25% nos juros e a relação com a taxa longa do DI).
    Mas também não posso deixar de concordar que o que necessitamos mesmo é diminuir os gastos públicos (inchaço da máquina pública já dura algum tempo). Os gastos por sua vez aumentaram no custeio e não na parte de investimentos.
    Outro ponto é de que, teoricamente, o BC é independente. Os grandes jornais deveriam abordar é o que está acontecendo com o presidente do BC, que não tem nem mais opinião.

    Lucas

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